Poesias

































O velho do rio
Ricardo Evangelista

O menino nasceu às margens do rio
e pensava como todo menino pensa
que aquele rio que passava no fundo da sua aldeia
era a presença de um deus.
o menino cresceu brincando com o rio
afogando-se nos mistérios do rio
que chamava de seu.
o rio matou fome de menino
com os bichos do rio
matou fome de seus filhos e netos
matou fome de seus sonhos.
o menino sofreu com a dor do rio
quando o rio quase morreu.
o menino chorou com o rio
e nesse redemoinho cresceu
virou homem do seu próprio destino
virou homem do seu próprio degredo
hoje não é o mesmo menino
nem o rio é o mesmo,
mas o velho do rio que agora vê o rio
com a sabedoria de menino
lembra chorando e sorrindo
que um rio será sempre
um presente dos céus.

2º LUGAR NO CONCURSO DE POESIA ECOLOGIA, SOBREVIVÊNCIA E PAZ - TABA CULTURAL (2009) RIO DE JANEIRO

ef. Evangelista, Ricardo. MINERAL, Ed. Rede Catitu Cultural (2010 )


RECEITA DE FEIJÃO TROPEIRO 
Ricardo Evangelista
                                                                   * Troca de receita com Vinícius.
Pediram minha receita
de um bom prato mineiro
mostro nesta feita
como se faz o feijão tropeiro.

Há que se dar o primeiro passo:
coloca-se o feijão pra cozinhar,
enquanto eu também faço
o tempero que vou usar.

Antes de mais nada
separa-se bem ligeiro
os ingredientes na bancada
para fazer o tempero

Numa pequena vasilha
coloca-se sal e alho
cebola, salsa, carícia
que assim eu não falho.

Corta-se em rodela
duzentos gramas de lingüiça
a melhor de todas elas
pro feijão ficar uma delícia.

Leve ao fogo, misture, prove
com a gordura bem quente
frita-se o torresmo separadamente,
enquanto afogo a couve.

Põe-se uma folha de louro,
ovos fritos e experimenta
o tropeiro ficará um estouro
com a pitada de pimenta.

Torresmo então, é bem vindo!
enquanto o cheiro inunda a narina
Finalizamos o nosso rito
colocando um bocado de farinha.

Agora o pulo do gato
com este toque de Minas
acompanha-se o prato
com a cachaça de Salinas.



ORAÇÃO DO ARTISTA
Ricardo Evangelista

Senhores deuses da arte, que estão conosco nos palcos, picadeiros, praças e ruas de todo recanto deste país, santificai nossa função de divertir, poetizar, sensibilizar e emocionar o público mais diverso onde quer que estejamos, mesmo que a bilheteria seja pequena.
Daí--nos dignidade, saúde e harmonia para desempenharmos da melhor maneira o nobre ofício de artista.
Protegei nossos passos no caminho infinito da imaginação e do lirismo e obrigado pela fantasia poética fazer parte de nossa existência.
Fazei com que nosso talento se aprimore sempre e nos livrai da dor de cabeça, da cólica, da inveja e da ziquizira.
Livrai-nos também, daqueles produtores que tentam nos passar a perna, dos empresários lacaios do mercado cultural e do mau humor de alguns técnicos de som.
Bendita seja nossa perseverança e paciência, para continuarmos fazendo arte nesta cidade e neste estado.
E por fim, livrai-nos do mau agouro, do estrelismo, da desunião e da arrogância, tão praticados por nós do meio artístico. 
Agora e na hora do nosso fracasso e do nosso sucesso, amém!!!

Ref. Evangelista, Ricardo. MINERAL, Ed. Rede Catitu Cultural (2010 )

MINEIRO QUE É MINEIRO 
Ricardo Evangelista

Mineiros são minérios escondidos
são mistérios e rodeios.
Mineiros são cheios de horizontes e para se forjar melhores
 se escondem à sombra da árvore da paciência.
Por isso mineiro medita e seu orgulho de ferro
é rijo e resistente e na boa medida.
Tem os pés firme no equilíbrio e os olhos mirando o infinito.
Mineiros medem o pó do café e do açúcar,
comem pelas beiradas,
e quando erram sabem pedir desculpas.
Mineiro se adapta aos apuros, 
sabe driblar os  apertos,
sabe sair da saia justa.
Mineiro quando se agrupa é revolução na certa.
Mineiro que é mineiro só se entristece com perdas,
tem a saudade como companheira e segue tenaz na labuta,
como se soubesse a hora exata da recompensa justa.
Mineiros são de silêncios e de palavra aguda,
diante de cara feia ou diante da ação estúpida,
diante do abuso mineiro se indigna.
Mineiro não declina de responsabilidade.
Mineiro calcula tudo, até quantidade de estrelas no céu,
advinha até a hora em que o peixe fisga.
Mineiro critica e aplaude quando admira.
Mineiros são de reticências e entrelinhas.
Mineiro que é mineiro desconfia,
mas quando acredita vai até a última consequência.
Mineiros são tantos quantos são os braços de um rio,
mineiros têm muitos desvios.
Mineiro é de sentimento profundo
quando se trata de família.
Mineiro não dá bom dia a cavalo,
mas fala muito quando sabe do assunto.
Mineiro que é mineiro tem sempre um causo na algibeira
e um verso triscando na ponta da língua.
Mineiro não perde trem nem por brincadeira
e não dá bola pra intriga,
dá um boi pra não entrar em confusão
e uma boiada pra não sair da briga.
Mineiros são o Brasil matreiro.
Mineiro é bom de mandinga
sabe simpatia pra acabar com cobreiro,
dor de cotovelo e de barriga.
Mineiros são tantos quantos são as surpresas da vida.
Mineiros sabem coisas que até Deus duvida.  

Poema visual: Consumismo . autor: Ricardo Evangelista

Poema visual: FMI , autor: Ricardo Evangelista

Poema visual: Paz . autor: Ricardo Evangelista
 

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Texto: Ricardo Evangelista